ROTEIRO SUCINTO PARA ELABORAÇÃO DE UM PROJETO DE PESQUISA

                                                       IVANY RODRIGUES PINO
                                                          DECISAE/FE/UNICAMP

  Introdução

O projeto de pesquisa deve refletir os pólos: epistemológico, teórico e tecnológico do processo de produção do conhecimento. Eles não configuram momentos separados da pesquisa, mas aspectos particulares de uma mesma realidade de produção de discursos e de práticas científicas. Na sua elaboração deve-se considerar a possibilidade de variação na sua composição, dependendo entre outros fatores: do tipo da pesquisa (qualitativa/quantitativa, inclusive sem a exclusividade de uma delas)-, do modelo da pesquisa (histórica, comparativa, estudo de caso, entrevista da natureza do objeto, da formação do pesquisador, da orientação das organizações de financiamento, das Universidades, Departamentos, Agências, Fundações ou Centros de Pesquisa.


Entretanto alguns elementos são mais ou menos constantes nos projetos de pesquisa, tais como: a seleção do tema, a problemática, o recorte do objeto com a enunciação do(s) problema(s), justificativa e relevância teórica e social, delimitação do objeto, objetivos, formulação teórica (referencial) e explicitação conceitual, revisão bibliográfica, hipóteses, amostragem técnicas para coleta de dados, previsão de tratamento dos dados, orçamento e cronograma. A origem de um projeto de pesquisa pode estar situada em "interesses e condições variadas" que levarão o pesquisador a orientar-se na escolha da problemática dentro da complexidade do campo de educação. É desta problemática - ampla, abrangente, desvelando a complexidade do tema - que será recortado o objeto. Este não é dado por si e nem salta do real, é construído. Sua construção - feita pelo pesquisador - é ancorada no encontro da teoria e do real. É desse encontro que sai(em) a(s) indagação(ões) - questão(ões) que colocada(s) ao objeto comporá(ão) o(s) problema(s). Este(s) problema(s) constitui(em) "o instrumento fundamental para se circunscrever, pouco a pouco, o âmbito dos fenômenos inquiridos e a orientação das informações" (ibld). A construção do objeto da pesquisa não se faz de forma nem imediata, nem linear. Pressupõe conhecimentos progressivos tanto sobre o tema selecionado quanto sobre o estado atual da produção de pesquisas relativas a ele que irão ajudar, inclusive, no delineamento da problemática (relativa ao tema) e das questões que devem ser colocadas ao objeto. As reflexões, as análises vão acumulando-se, organizando as idéias e permitindo o vigor do processo de elaboração do projeto. Neste movimento, é preciso haver o encontro entre teoria e real e o pesquisador deve estar atento para que ele permaneça durante todo o processo da pesquisa.

  DESENVOLVINIENTO DO TRABALHO

Um projeto de pesquisa deve conter, fundamentalmente os seguintes elementos- I - Introdução II - Problemática, recorte do objeto, problema(s), justificativa, relevância e limites III - Objetivos IV -Quadro ou referencial teórico e o estado atual da pesquisa sobre o tema V - Hipóteses, definição e operacionalização das variáveis (se for o caso) VI -Metodologias: 1. Tipo, modelo e modo de pesquisar 2. Definição do campo de pesquisa 3. Pólo tecnológico- escolha e construção 4. Procedimento para a coleta de dados 5. Previsão de tratamento dos dados Vlll - Cronograma de atividades

I - Introdução

 O importante neste item é que o tema e o pesquisador sejam contextualizados. É, portanto, a apresentação do projeto de uma forma geral, podendo situar ai a trajetória do pesquisador e o "lugar" de onde fala.

II - Problemática

É o momento privilegiado do pólo epistemológico, embora, ao longo de toda pesquisa, ele seja a garantia da objetivação da pesquisa, da ruptura com o senso comum. Esta é a primeira parte do projeto de pesquisa e define-se pela apresentação, de forma clara, permitida pelo estágio no processo da construção da problemática, do objeto, e do(s) problema(s) a ele colocado(s). É importante que esteja nela refletido o trabalho anterior do pesquisador no processo de construção do objeto que supõe: conhecimento mínimo do real e da teoria. Assim, desta parte do projeto devem constar: - problemática - objeto em construção esboçado em recorte - problema(s) - justificativa - relevância- teórica e social - limites A problemática refere-se a complexidade de problemas relativos ao tema e, por sua natureza, apresenta-se ampla e abrangente. O movimento da sua construção deve caminhar no sentido de ir afunilando-a para chegar no objeto (recorte de um ângulo do real visto de algum lugar). Esse processo não é fácil de ser conduzido uma vez que esse lugar deve estar ancorado nos procedimentos da produção da ciência com todas as suas implicações - o visto não é tradução do senso comum, o lugar não é o da neutralidade, a-histórico, mas da procura, do encontro ideologia X ciência, com sua significação epistemológica. O(S) problema(,s) colocado(s) ao objeto, refletirá(ão) aquela(s) questão(ões) que orientar(ão) o processo da pesquisa em todas as suas fases subsequentes, que não são estanques- elas se interpenetram. É neste sentido que o pólo teórico da pesquisa deve ser visto: como uma construção elaborada mesmo antes da natureza do objeto - refletindo nele a teoria e o real e o pólo tecnológico deve ser submetido ao epistemológico para estar consoante com seus alcances e limites. A justificativa da seleção do objeto apoia-se na sua relevância teórica e social. A relevância teórica é relativa a sua posição no estado atual do conhecimento produzido sobre o tema, a problemática e o objeto construído. A relevância social deve refletir a importância relacionada as demandas da sociedade nas dimensões da relação ciência/conhecimento/sociedade. Os limites dependem da natureza do objeto e assim podem ser eles: teóricos, espaciais, temporais, históricos Portanto, esta fase supõe, da parte do pesquisador, um trabalho anterior de levantamento e análise críticas de pesquisas já efetuadas sobre a problemática, a fim de permitir identificar sua realidade, relevância e posição teórica (estado atual da questão, forma, conteúdo, significação passível de verificação científica.

III - Objetivos- Geral e Específico

Eles devem ser formulados intimamente ligados à natureza do objeto e às questões a ele colocadas.

IV - Formulação teórica - explicitação conceitual. Revisão bibliográfica (estado atual da pesquisa)

De suma importância este item constituirá o suporte teórico da pesquisa. Nele devem estar trabalhadas e discutidas teorias, "modo de construção do objeto de conhecimento científico que formará o quadro referencial pertinente ao estudo. Aqui também deve ser mostrado o conhecimento das pesquisas atuais sobre o objeto, supondo uma discussão sobre elas porém contando compreender esse conhecimento e possibilidade de apresentá-lo como teoria. A revisão bibliográfica poderá ser organizada por tópicos envolvendo os diferentes aspectos do problema, entretanto, deve-se notar apenas alguns estudos (os mais significativos) que devem ser discutidos e outros apenas citados. O pólo teórico guia a elaboração das hipóteses e a construção dos conceitos. É o lugar da formulação sistemática dos objetos científicos; o que significa, portanto, que ele não se constitui em citações, compilações de autores, ou soma de teorias, mas sim, na construção dos quadros referenciais que desempenham um papel paradigmático implícito. Sua concepção supõe, portanto, uma construção onde o pesquisador dialoga com a(s) teoria(s) com a(s) qual(is) trabalha desde o início do projeto e durante todo o processo do ato de pesquisar.

V - Hipóteses, definição e operacionalização das variáveis

As hipóteses, geradas substancialmente no quadro teórico, devem ser elaboradas de forma clara, precisa e direta, sendo sempre uma proposição conjetural que, de alguma forma, antecipa de maneira explicativa os problemas colocados ao objeto. Para um melhor encaminhamento do projeto (quando a pesquisa é quantitativa), é imprescindível definir operacionalmente as variáveis envolvidas, o que não apenas facilita o trabalho, como também serve de diretriz para o encaminhamento dos instrumentos a serem usados (transformação das variáveis em indicadores, tendo como mediadores os constructos e conceitos). Hipóteses, na pesquisa qualitativa, podem ser dispensadas, o mesmo não é costume acontecer na pesquisa quantitativa.

VI - Metodologia

1. Tipos, modelos e modos de pesquisa

Neste fase é importante explicitar e justificar o tipo de pesquisa a I ser desenvolvido (qualitativo, quantitativo, ou ambos). Esta explicitação implica em uma direção na seleção do seu modelo (experimental, etnográfica, histórica, estudo de caso, comparativa, survey ), seleção esta, não só intimamente ligada à natureza do objeto e aos seus paradigmas teóricos, mas também, que encaminhará a pesquisa no seu polo tecnológico, ou seja, o modo de ir ao real orientando o movimento de sua separação, de sua des/construção. A elaboração do design no caso de pesquisa quantitativa, baseado no quadro teórico e nas hipóteses, orientado pelo tipo de pesquisa e natureza do objeto, poderá facilitar o procedimento nas fases posteriores, sobretudo aquela da seleção e construção de técnicas. O design possibilita certa garantia de direção dos dados a serem levantados (des/construção do real), em relação à verificação e testagem das hipóteses.

2. Definição do campo de pesquisa

O campo de pesquisa é caracterizado pelo tipo, modelo, e modo de pesquisar escolhidos. Assim, para pesquisa qualitativa, estudo de caso, etnográfica, comparativa, dependendo da natureza do objeto e dos seus paradigmas teóricos, o campo pode ser o "lugar" da "escola", da "sala de aula", do sindicato, do movimento social, das mulheres ( ) considerado em seu caráter singular. A questão da generalização contrapondo-se com a singularidade. Se a escolha é definida como uma pesquisa quantitativa de opinião, levantamento/survey pela natureza do objeto e dos seus paradigmas teóricos, então o campo de pesquisa supõe, não mais singularidade, mas a necessidade da generalização, com exigência de definição de universo, recorte de população e delineamento da amostragem. Neste caso, a escolha da população, plano de amostragem, a descrição dos procedimentos a serem usados, devem ser elaborados clara e exaustivamente no plano de amostragem. O plano de amostragem é o processo de utilização de uma parte como base para uma estimativa do todo. A amostra, como o nome indica, é a menor representação de um todo maior. Conclusões ou generalizações serão feitas a respeito do todo tomando estudos feitos sobre uma parcela representativa, ou seja a amostra. Trabalha-se, em pesquisa quantitativa com diferentes tipos de amostragem e a escolha de um deles, vai, mais uma vez, depender não só da natureza do objeto, como também do paradigma teórico e das hipóteses. Cada um dos tipos de amostra tem alcance mas também [Imites que são indícios para casos específicos. O rigor metodológico na sua escolha e aplicação está ligado às exigências científicas e é um suporte imprescindível da pesquisa quantitativa. Nesta fase é importante explicitar o tipo de pesquisa a ser desenvolvido. A sua explicitação implica não só a descrição da forma como ela será encaminhada corno também a seleção da tecnologia da pesquisa.

3. Pólo tecnológico: escolha e construção das técnicas de pesquisa

O pólo tecnológico no processo de seleção e construção de técnicas - considerando seus alcances e limites do ponto de vista epistemológico - controla a coleta de dados, processo de separação, des/construção do real, para confrontá-lo com a teoria que os suscitou que orientará sua re/organização no processo de re/construção/interpretação. O polo tecnológico exige precisão na sua construção, entretanto, sozinho não garante exatidão e nem significado. O pólo tecnológico ancorando-se em modelos particulares de pesquisa. estudos de caso, estudos etnográficos, estudos comparativos, experimentações, simulações... exige modos de investigação indicando escolhas epistemológicas, teóricas e práticas pelas quais os pesquisadores optam por tipos particulares de encontro com os fatos empíricos. Esse tipo de encontro, que constituem formas específicas de técnicas- observação, questionários, entrevistas, etc., têm seus alcances e limites. Sua escolha liga-se intimamente com a natureza do objeto, com paradigmas teóricos, além dos modos de pesquisa, tendo em vista o processo da abordagem do real, considerando-se que sua des/construção dar-se-á através do "levantamento dos dados" (primários e/ou secundários) e o plano de tratamento (re/organização do real - reconstrução) através da sua compreensão. análise e interpretação Uma das fases importantes da pesquisa é pois, a determinação de como serão coletados os dados (e informações necessárias para testar a(s) hipótese(s) ) e a construção destes instrumentos. As técnicas escolhidas deverão estar diretamente relacionadas com o modelo de pesquisa a ser utilizado, com a natureza do objeto, o quadro teórico, (bem como com as hipóteses estabelecidas, caso explicitadas, e a operacionalização das variáveis no caso de pesquisa quantitativa). Portanto, antes de se realizar a coleta de dados, deve-se selecionar, elaborar (testar) cuidadosamente os instrumentos de coleta. E importante que o pesquisador esteja alerta quanto à adequação dos instrumentos escolhidos, testá-los se foro caso, aos seus limites e alcances. Os instrumentos devem ser selecionados conhecendo seus limites e alcances, escolhendo aqueles mais condizentes com o objeto, com os objetivos da pesquisa, com o quadro teórico e com as hipóteses (se for o caso).

4. Procedimentos. plano de coleta de dados

Os resultados de uma pesquisa dependem, também dos dados e do modo como foram coletados. Na pesquisa quantitativa, mesmo que a amostra tenha feita cuidadosamente os dados obtidos relacionam-se com o trabalho adequado dos entrevistadores. Em qualquer tipo de pesquisa, a fim de obter dados o mais possível coerentes, "livre" de erros introduzidos por entrevistadores, observadores e outras' pessoas, é necessário orientar e preparar a equipe dos que trabalham na coleta a fim de se obter dados o mais possível controlados, honestos, completos, coerentes e precisos. Os erros mais comuns no processo de coleta são oriundos das distorções, ênfases que cada entrevistador faz ao fazer a pergunta: voz diferente, acentuação, aparência, expressão facial. Há também, erros resultantes de expectativas dos entrevistadores com respeito à resposta dos entrevistadores. Erros na transcrição das respostas ou nas situações em que não é possível fazer anotações, a memória do entrevistador poderá ficar sobrecarregada ocorrendo omissões, consequentemente surgindo aspectos tendenciosos. Em caso de esquecimento sugere-se que o entrevistador anote simplesmente as palavras-chave ou letras e quando se afastar do local poderá registrar os eventos associando-se às letras ou às palavras-chave. Se a relação sujeito-objeto foi presente durante todo o processo, aqui ela se fará particularmente forte e, se foi questão da "busca da objetividade" durante todo o processo anterior, a "vigilância epistemológica", por parte do pesquisador se faz imprescindível. Não para alcançar ou garantir a "neutralidade" - inexistente na ciência - mas para se situar em relação ao "lugar" de onde fala. Isto significa que as visões sociais de mundo fazem-se presentes em todo o processo do conhecimento e interpretação da realidade social. Portanto a objetividade não pode, não só ser garantida por todos e outros procedimentos anteriormente e eventualmente citados, como também não pode "consistir no estreito molde do modelo científico-natural". "A verdade objetiva sobre a sociedade é antes concebida como uma paisagem pintada por um artista e não como uma imagem de espelho independente do sujeito; (...) tanto mais verdadeira será a paisagem, quanto mais elevado o observatório ou onde estará situado o pintor, (grifo meu, significando aqui o "lugar" da fala, do olhar ) permitindo-lhe uma vista mais ampla e de maior alcance do panorama irregular e acidentado da realidade social" (LOWY, 1988).

5. Previsão de tratamento dos dados

O tratamento dos dados supondo sua re/organização varia segundo a natureza do objeto, o modelo da pesquisa e os instrumentos utilizados. No caso de pesquisa quantitativa deve-se observar o tratamento estatístico adequado. Supõe-se que os dados re/organizados estarão sendo re/construídos no sentido da busca da compreensão- análise e interpretação.

VII - Bibliografia

Relacionar toda a bibliografia consultada de forma conveniente em termos teóricos, de pesquisa sobre o tema e metodologia, seguindo as normas da ABNT. No caso de: 1. Citações a) Citação no corpo do texto- (Autor, data), eventualmente a página. b) Caso autor tenha mais que uma produção no mesmo ano. (PAIVA, 1978, a), (PAIVA, 1978, b), acrescentar letras: a, b, c,. 2. a) Livros,- Autor, (data). Título grifado. Editora, Edição, Local, página. b) Artigos: Autor (data) Título grifado. Revista maiúscula Editora, Edição, Local, número, página.

VIII - Cronograma de atividades

Delimitar o tempo segundo as etapas da pesquisa.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CENÁRIO DAS PESQUISAS ELEITORAIS NA REGIÃO NORTE DO BRASIL

Compartilhamento de mídia social, notícias e formador de opinião: pesquisas recentes

NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DE PESQUISAS QUANTI E QUALI

DIFERENÇAS ENTRE PESQUISAS QUALI E QUANTI