O papel da mídia na formação da opinião pública: a contribuição de Bourdieu

Carla Luciane Blum Vestena
Professora do Departamento de Pedagogia - UNICENTRO/Guarapuava(PR).
Email: clbvestena@gmail.com

Guairacá - Guarapuava, Paraná n.24 p.9-22 2008

Resumo: Este estudo tem por objetivo refletir sobre a mídia e sua influência na formação da opinião pública, com base na teoria de Bourdieu. Inicialmente, apresentam-se os conceitos do que é mídia e do que é opinião pública e, posteriormente, aborda-se seu papel na formação das percepções e concepções da sociedade. A metodologia adotada pautou-se por um levantamento bibliográfico dos propósitos expostos por Bourdieu que, em seus estudos, concluiu que são os mecanismos de reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação. Verificou-se que a violência simbólica permeia também os meios de comunicação, que a mídia exerce influência na formação da opinião pública, porém com certas restrições, e que os propósitos de Bourdieu são importantes na análise do papel da mídia na formação da opinião pública.

Palavras-chave: mídia; formação de opinião; Bourdieu.

Abstract:The aim of this work was to think over the media and its influence on formation of public opinion, having as support the Bourdieu’s theory. It presents the concept of media and public opinion, and think about their paper on the formation of perceptions and conceptions of the society. The methodology focused on a bibliographical study about Bourdieu’s theory, who assumed that the mechanisms of the social reproduction legitimate the several dominance forms. It was ended that: the symbolic violence also permeates the communication system; the media exercises influence over the formation of public opinion, however with certain restrictions; and Bourdieu’s purposes are important to analyse the paper of the media on the formation of public opinion.
Key-words: media; Bourdieu’s theory; opinion formation.

Introdução
Em seus estudos sobre violência, Bourdieu e Passeron (1975) desenvolveram conceitos específicos, retirando os fatores econômicos do epicentro das análises da sociedade, a partir de um conceito concebido como violência simbólica. Também, defenderam a não arbitrariedade da produção simbólica na vida social, advertindo para seu caráter efetivamente legitimador das forças dominantes, que se expressam por meio de gostos de classee estilos de vida, gerando aquilo que ele reconhece como distinçãosocial.
Com base nessa teoria, será analisado o papel da mídia na formação da opinião pública, por meio dos conceitos fundamentais de mundo social concebidos por Bourdieu, como sendo campo, habitus e capital.
Desvendamento do campo de análise: a mídia Em meados de 1950, os pensadores da Escola de Frankfurt atribuíram, ao então nascente “mundo-mídia”, um poder totalizante. Ao longo dessas décadas, o conceito de comunicação foi se transmutando até chegar hoje ao que Albino Rubim, em 2005, define como um conjunto de meios diferentes, cada vez mais refinados tecnologicamente.
Mídia não é tão-somente o aparato tecnológico. Há que se compreender mídia como associação de um suporte tecnológico, uma linguagem adequada e uma estratégia de ação precisa e clara (SANTARENO, 2007).
-----------------
1 Surgiu em 1923, da iniciativa de pensadores alemães em formarem o Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, com o objetivo de realizar um exame crítico da sociedade em geral e em seus aspectos econômicos, culturais e de produção de conhecimento - a partir de uma perspectiva marxista renovada (não presa ao historicismo e materialismo).
-------------------
Na década de 1980, o conceito de opinião pública era diversificado, não existindo um consenso nas Ciências Sociais, tanto em relação ao conceito quanto a sua formação. A teoria mais conhecida é a que procura explicar o processo de formação da opinião pública por meio do modelo cascata. Para Lima (2005), o modelo cascata, explica a formação da opinião pública, como “resultado de um fluxo linear de informações do topo da pirâmide social até as ditas classes populares”. Às lideranças das elites sociais resta emitir suas opiniões, através dos meios de comunicação, para que as massas ignorantes as absorvam como suas novas verdades.
Na maioria das vezes, “a literatura elitista3 apresenta a opinião pública como o resultado de uma série de processos sociais, nos quais há uma interação muito grande de elementos emocionais e manipulativos” (LIPPMANN, 1997), aliados “à pouca racionalidade” (LE BON, 1999).
No entanto, ao ser considerado como fator relevante para o funcionamento da democracia, a opinião pública foi conceituada por Bobbio (1998) como “pública” em um duplo sentido. Primeiro, “porque ela surge do debate público” e, segundo, “porque seu objeto é qualquer coisa”, desde que seja de domínio público. Sendo assim, opinião pública, para ele, é:
(...) uma opinião sobre assuntos que dizem respeito à nação ou a outro agregado social, expressa de maneira livre por homens que estão fora
--------------------------
2 Segundo essa proposta, a opinião pública se formaria a partir de pequenos grupos, situados no topo da pirâmide social e depois viria “descendo”, por degraus, até a base da pirâmide. No primeiro degrau dessa “cascata”, estaria o pequeno grupo das elites econômicas e sociais; no segundo grupo estariam o das elites políticas e, no terceiro, a mídia, seguida pelos chamados formadores de opinião – intelectuais, religiosos, artistas, educadores, líderes empresariais e sindicais, jornalistas – e, finalmente, no último degrau, a grande maioria que constitui a base da população.
3 O elitismo como corrente teórica da comunicação política predominou até os anos 50, principalmente a partir das análises sobre a realidade norte-americana e alemã, que retomam sua força nos anos 70. Autores ligados a essa corrente, tais como Lippmann (1922), Katz (1957) e Lasswell (1936), afirmam que o cidadão só pode conhecer a realidade social através da mídia, dada a sua condição atomizada na sociedade.
---------------------------------
do governo, mas que reclamam o direito de que suas opiniões possam influenciar ou determinar ações governamentais. (BOBBIO, 1998)
Afinal, a opinião pública nas democracias contemporâneas é uma influência legítima ou não nas decisões de governo?
Opinião Pública é a expressão de opiniões do público a respeito de temas de interesse comum, que se diferencia da Opinião Publicada, que é a apresentação pública da opinião. Essa distinção foi feita pela primeira vez por Allport (1937) no texto Toward a Science of Public Opinion, onde afirma que tratar Opinião Pública e Publicada como sendo a mesma coisa é uma falácia.
Os estudos sobre o resultado da campanha de desarmamento apontaram que a proibição do comércio de armas deveu-se ao fato de que:
(...) a campanha do NÃO soube explorar a percepção de segurança pública construída ao longo dos últimos anos pela mídia. Enquanto, por outro lado, o SIM, foi incapaz de demonstrar que representava uma probabilidade eficaz de mudança, uma vez que a realidade que ele pretendia mudar não correspondia ao panorama de insegurança construído a partir das percepções difundidas pela mídia. (VAZ et al., 2007)
À sensação de insegurança se adicionou a incerteza do voto e, do ponto de vista racional, os eleitores votaram a favor dos riscos bem conhecidos do presente em detrimento dos riscos desconhecidos do futuro. Desse ponto de vista, a campanha do plebiscito na TV foi uma disputa entre as “vítimas reais” (sempre, atuais e particulares), que o SIM pretendeu colocar em cena ao seu lado, e as “vítimas virtuais” (vítimas futuras e universais) que o NÃO se propunha a defender.
Para Vaz et al. (2007), a campanha do SIM “exigia dos eleitores que eles renunciassem à sua condição universal de vítimas e aceitassem se tornarem co-responsáveis – não apenas no momento do voto, mas no seu cotidiano – pela segurança e pela insegurança públicas” (VAZ et al, 2007). Essa era uma abdicação que o eleitor não estava predisposto a fazer. Por isso, a maioria disse NÃO aum “direito” que, em sua maior parte, nunca havia se preocupado em exercer ou defender.
No debate atual sobre a opinião pública, o desempenho dos líderes de opinião reforça a idéia de uma inter-relação entre os meios de comunicação, os indivíduos portadores de características exemplares e o próprio público. É essa complexa relação que possibilita o fornecimento de informações à opinião pública (Quadro 1).
Quadro 1 - Modelo de fluxos de comunicação social
 









Fonte: Modelo de fluxos de comunicação social (CORRÊA, 1993) adaptado de Dumazeider (1973)
Uma questão bastante relevante é a fonte que, em qualquer situação de persuasão, seja ela a mídia ou outro indivíduo em uma relação pessoal, “sempre tenta persuadir alguém a adotar determinada posição” (LANE e SEARS, 1964).
Nesse sentido, seria muito arriscado para a elite política tomar como princípio de sua atuação o atendimento à opinião pública, visto que ela pode ser, através de instrumentos específicos, manipulada para atender a determinados interesses que não são os do bem comum (LIPPMANN, 1997).
Ao desacreditarem na existência de uma opinião pública, Bourdieu (1983) e Champagne (1998) justificam a existência, por um lado, de opiniões mobilizadas, constituídas, ou seja, grupos de pressão mobilizados em torno de um sistema de interesses; e, por outro lado, de disposições, isto é, da opinião no estado implícito.
Entretanto, Page e Shapiro (1992) defendem que a opinião pública não é apenas resultado de manipulações emocionais, pois ela apresenta uma racionalidade que se diferencia da estabilidade absoluta por ser pública. Essa “opinião deve se remodelar sempre que houver uma alteração perene ou transitória na composição das relações sociais dos pertencentes ao público” (PAGE e SHAPIRO, 1992).
Contudo, Sartori (1994) acredita que as opiniões públicas não são inatas, nem surgem do nada. Para ele, a questão sobre o que é opinião pública é respondida por meio do processo de disseminação de opiniões, a partir de níveis da elite; borbulhar de opiniões, a partir das bases, e identificações com grupos de referência. Nota-se que a complexidade desse tema não permite seu findar, porém suscita inúmeras discussões.
Sendo assim, considera-se que a opinião pública não é capaz de promover mudanças em si mesma, visto que ela é o resultado dos agregados de alterações nas opiniões particulares. Conforme Bouza (1998), “a realidade é muito mais ampla que a capacidade da mídia em retratá-la a seu modo”.
Além disso, os resultados de trabalhos empíricos apontam que a opinião pública é racional e coerente. Por isso, as prioridades políticas coletivas são previsíveis, pois tratam do resultado de avaliações públicas sobre políticas já inseridas.
A mídia contribui na formação da opinião pública?
A mídia parece perder, dia a dia, a superioridade no tocante à formação da opinião pública, entre outras coisas, pela acentuada crise de confiabilidade da chamada “grande imprensa” associada a uma questão central: a concorrência das novas modalidades digitais de comunicação, das quais surge um novo “destinatário” e/ou “consumidor” de informações (SANTARENO, 2007).
No caso da televisão, tem-se por certo que ela é “um formidável instrumento de manutenção da ordem simbólica”, por desempenhar uma força perniciosa de violência simbólica: é uma violência que se exerce com a cumplicidade tácita dos que a sofrem e também, com frequência, dos que a exercem. A violência simbólica está na ação simbólica da TV no plano das informações, por exemplo, que consiste em atrair a atenção para fatos que interessam a todo mundo, dos quais se pode dizer que são omnibus, ou seja, “para todo mundo”. Com “a televisão estamos diante de um instrumento que, teoricamente, possibilita atingir todo mundo” (BOURDIEU, 1997).
Diante desse fato, a Sociologia, como todas as ciências que procuram desvendar coisas ocultas, poderá fornecer a minimização das relações sociais, especialmente, nas relações de comunicação pela mídia. Para Bourdieu, “há uma proporção muito importante de pessoas que não lêem nenhum jornal, que estão devotadas de corpo e alma à televisão como fonte única de informações” (BORDIEU, 1983).
Tal influência da mídia, em particular da TV, é referenciada por Champagne (1993), em “La misêre du monde”, no capítulo que trata da representação que a mídia dá aos fenômenos ditos de “subúrbio”.
Os jornalistas selecionaram categorias de percepção de acordo com suas respectivas visões de mundo. A categoria metafórica utilizada é a dos óculos, fruto da educação histórica deles, porque é “a partir dos quais vêem certas coisas e não outras, e vêem de certa maneira as coisas que vêem. Eles operam uma seleção e uma construção do que é selecionado” (BOURDIEU, 1997).
De acordo com Bourdieu (1997), “as palavras fazem coisas, criam fantasias, medos, fobias ou simplesmente, representações falsas”. Dessa forma, o mundo da imagem é dominado pelas palavras.
O princípio da seleção por meio da busca sensacional dos espetáculos permitiu destacar a TV, que dramatiza cenas e imagens de um acontecimento relevante, muitas vezes, de acontecimentos trágicos e de rebeliões.
Há problemas, dúvidas e virtudes no mundo digital. A respeito dos problemas, destaca-se o vandalismo digital, a invasão de privacidade, a pirataria e a baixa do número de empregos devido à automatização. Impera a incapacidade do mundo digital de resolver a questão da vida e da morte e a fome. As virtudes giram em torno da descentralização, da quebra de fronteiras pelos bits, da globalização, da capacitação (em conseguir informação), da harmonização (empresas trabalhando juntas, por exemplo) e do fato de tudo isso estar nas mãos dos jovens (NEGROPONTE, 1995).
O sistema de televisão é mais flexível, pois permite ao telespectador escolher a hora e os programas que deseja assistir na TV.
Além disso, a tecnologia dos “bits que falam de outros bits” possibilita que as matérias de interesse do usuário sejam comparadas entre redes de televisão e de computadores (NEGROPONTE, 1995).
A TV, de acordo Bourdieu, de instrumento de registro torna-se um instrumento de criação de realidade, e assim, caminha-se “cada vez mais rumo a universos em que o mundo social é descrito e prescrito pela TV” (BORDIEU, 1997). Para Flaubert, apud Bourdieu (1979) o “mundo são idéias aceitas por todo mundo”, banais, convencionais comuns, ao ponto que quando aceitas o problema da recepção não se coloca.
A internet, depois do advento da sua área hipermídia - a Web, “expandiu 50% a cada ano durante a década de 90 impulsionada pelo interesse dos usuários (...)”. conforme Dizard (2000). Questiona-se assim, até que ponto, “a nova mídia nos tornará individual e coletivamente mais livres e mais competentes para lidar com os complexos problemas da democracia pós-industrial” (DIZARD, 2000).
“Sociedade pós-industrial” para Lyotard (1979), “sociedade informática” para Schaff (1995), “sociedade tecnizada” para Machado (1993), “sociedade do conhecimento” para Toffler (1990) ou “sociedade em rede” para Castells (1999), são as várias denominações que esses autores dão à nova maneira social resultante de uma sociedade globalizada, que enfatiza a produção econômica recaindo sobre o setor de serviços e utiliza amplamente o conhecimento das inovações tecnológicas proporcionadas pelas novas tecnologias de comunicação, pela informática, pela microeletrônica.
O pensamento que é, por definição, revolucionário, deve começar por demonstrar as “idéias feitas” e em seguida evidenciá-las (isso pressupõe tempo). Para ser capaz de “pensar” em condições em que ninguém pensa mais, é preciso ser pensador de um tipo particular. Para isso é preciso:
(...) sempre pensar as relações que podem estar visíveis nas formas de coexistência, de sociabilidade, ou de relações entre indivíduos, ou ainda de relações mais abstratas, mais estruturais, que organizam o campo - conceito essencial, nesse sentido - da produção estética, filosófica, cultural, num momento e num lugar os dados (BOURDIEU e PASSERON, 1975).
Nesse sentido, os campos têm suas “próprias regras, princípios e hierarquias”, que são definidos a partir dos conflitos e das tensões no que diz respeito à sua própria delimitação e constituídos por redes de relações ou de oposições entre os atores sociais que são seus membros. Há em cada campo princípios de organização que são próprios desse campo. Um campo é
um espaço social estruturado, campo de forças onde há dominantes e dominados, há relações constantes, permanentes de desigualdade que se exercem no interior desse espaço – campo de lutas para transformar ou conservar esse campo de forças (BOURDIEU, 1979).
Assim sendo, o conceito de campo se insere entre as determinações socioeconômicas na definição mais tradicional da sociologia, da história social e da produção simbólica de idéias ou de obras.
Quanto aos campos culturais, estes devem ser considerados, primeiramente, como um mundo econômico invertido, pois existe uma economia da produção simbólica – que funciona com parâmetros opostos ao funcionamento do campo econômico. Isso significa que há uma inversão dos valores ou dos interesses que regem o campo econômico dentro dos campos culturais, onde o primeiro funda uma das tensões fundamentais, a de que “sua própria perspectiva intelectual implicava que ele fosse, ao mesmo tempo, objeto e produtor de sua análise” (BOURDIEU, 1997). A exemplo disso, o livro “Homo Academicus”, de 1984, que analisa um campo particular, o campo acadêmico, a que claramente Bourdieu pertenceu, consiste em uma análise sociológica do espaço social ao qual ele próprio pertencia. Neste campo, há o desinteresse estético ou intelectual contra a busca de benefício, de lucro econômico; a gratuidade do gesto contra a utilidade da produção; a arte pela arte contra a circulação e a acumulação do dinheiro.
Em segundo lugar, esses campos culturais se fundamentam numa capacidade de reflexão, de auto-reflexão, de consciência de si. Nesse mesmo livro,“Homo Academicus”, de 1984, Bourdieu expressou, no prólogo, a dificuldade de constituição de qualquer discurso científico sobre o mundo social. Pensava que havia uma dificuldade em elaborar um discurso analítico sobre o mundo social porque havia uma aversão do mundo social frente a sua própria verdade — particularmente, mas não unicamente, dos dominantes. O discurso sobre o mundo social é “sempre difícil porque é contrário à natureza dos interesses imediatos das desigualdades. E, desta maneira, a tarefa não é fácil — talvez seja mais fácil escrever sobre o século XV ou XVI, como eu” (BORDIEU, 1983).
Assim sendo, a dificuldade de qualquer discurso científico sobre o mundo social chega ao auge, no caso de um discurso que se dedica ao espaço, ao próprio jogo no qual o seu autor se encontra comprometido. Tem-se a tensão entre, por um lado, a reconstrução dos mecanismos desconhecidos pelos indivíduos e, por outro lado, a necessidade do sociólogo de objetivar a sua própria posição como membro, nesse caso, do campo acadêmico e, mais geralmente, do campo social.
Nessa perspectiva, o sociólogo, ao fazer a adoção de um estilo de vida moderno, como se fosse o resultado de uma livre escolha, não permite que seja manifestada sua própria filosofia. Muitas vezes, as representações sociais são estratégias de luta que “comprovam a relação de força e visam a transformá-la ou a conservá-la” (BOURDIEU, 1997).
No sentido de pensar como a dimensão da incorporação, e os outros conceitos podiam parecer intelectualizados demais. Bourdieu introduz o conceito de habitus– que aponta para um sistema de esquemas de percepção, de juízo, de apreciação e de ação inscritos no corpo pelas experiências passadas (CHARTIER, 2002).
A interiorização da situação objetiva, os habitus de classe, é a estrutura unificadora do conjunto das disposições que supõem a referência prática ao futuro objetivo, quer se trate da resignação ou da revolta contra a ordem atual ou da aptidão a submeter as condutas econômicas à previsão e ao cálculo. Por isso, o uso de conceitos mediadores, como potencialidades objetivas ou habitusde classe, permite ultrapassar as oposições abstratas entre o subjetivo e o objetivo, o consciente e o inconsciente (BOURDIEU, 1979).
As condutas, por estarem escritas na situação presente dos seus próprios sujeitos, dispõem permanentemente em seus habitus e estão interiorizadas e à disposição diante de uma determinada situação sob a influência desta (BOURDIEU, 1979).
No que se refere à violência simbólica exibida pela mídia, Bourdieu (1997) expõe no livro “Sobre a Televisão” uma ruptura com todas as representações e concepções espontaneístas exercidas pelos propagandistas, jornalistas e um plano essencial, o discurso à diferença.
Considerações finais
Por fim, pode-se apontar que a violência simbólica exposta por Bourdieu permeia, também, os meios de comunicação, na medida em que determinadas emissoras de TV, jornais, rádios, entre outros, noticiam e enfatizam determinados eventos que acabam influenciando nos demais. Este fato pode ser facilmente comprovado nos dias atuais, com a globalização, que leva à crença de haver certa homogeneização das informações, ou seja, basta assistir noticiários de diferentes emissoras de TV, para constatar que a grande maioria das notícias são praticamente iguais.
Assim, os pressupostos propostos por Bourdieu são importantes na análise do papel da mídia na formação da opinião pública, por desvincular o foco central da análise da questão econômica.
Portanto, a mídia exerce influência na formação de opinião pública, porém com certas restrições de cunho cultural, religioso, enfim, dos filtros de canalização social.
Referências
ALLPORT, F. H. Toward a science of public opinion. Public opinion quarterly, 1, 1937, p. 7-23.
OPINIÃO PÚBLICA. In: BOBBIO, N. et al. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1998.
BOURDIEU, P. O desencantamento do mundo: estruturas econômicas temporais. Tradução de Silvia Mazza et al. São Paulo: Perspectiva, 1979.
______. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983.
______. Homo acadêmicus. Paris: Minuit, 1984
______. Sobre a televisão. seguido de a influência do jornalismo e os jogos olímpicos. Tradução Lúcia Machado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.
______; PASSERON, J. C. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Tradução de Reynaldo Bairão. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975.
BOUZA, F. La influencia politica de los medios de comunicación: mitos y certezas del nuevo mundo. Revista El Debate de La Comunicacón, Fundación General de la Universidad Complutense de Madrid, p. 237-252, 1998.
CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
CHAMPAGNE, P. La misére du monde. Paris:Seuil, 1993
______. Formar a opinião. Petrópolis: Vozes, 1998.
CHARTIER, R. Pierre Bourdieu e a história- debate com José Sérgio Leite Lopes. Topoi, Rio de Janeiro, p. 139-182, mar. 2002.
CORRÊA, T. G. Contato imediato com a opinião pública: os bastidores da ação política. São Paulo: Global, 1993.
DIZARD JR, W. A nova mídia. 1. ed. São Paulo: Zahar, 2000.
KATZ, E. The two-step flow of communication: an up-to-date report on an hypothesis. Public Opinion Quartely, v. 21 n.1. 1957.
LANE, R. E.; SEARS, D. O. Public Opinion. New Jersey. Prentice-Hall, 1964.
LASSWELL, H. D. Politics: who gets what, when, how. New York. McGraw-Hill, 1936.
LE BON, G. Psicologia das múltidões.Portugal: Publicações Europa-América, 1999.
LIMA, V. A. A opinião privada tornada pública. Observatório da Impresa. Ano 12, n. 342, de 16/08/2005. Disponível em: <http://observatorio.
ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=342 JDB001>. Acesso em 10 jan. 2008.
LIPPMANN, W. Public Opinion. New York: Free Press Paperbacks, 1997.
LYOTARD, J. A condição pós-moderna. 1. ed. Lisboa: Gradiva, 1979.
MACHADO, L. Sociedade industrial x sociedade tecnizada. Universidade e Sociedade, Ano 3, n. 5, p. 32-37, jul. 1993.
NEGROPONTE, N. A vida digital. Tradução de Sergio Tellaroli. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
PAGE, B. I.; SHAPIRO, R. Y. The rational public: fifty years of trends en american’s policy preferences, Chicago: University of Chicago Press, 1992.
SANTARENO, S. L. Mídia e opinião pública. Disponível em: <http://www.jesocarneiro.com.br/artigos/midia-e-opiniao-publica/15_10_2007/>.Acesso em 10 jan. 2008.
SARTORI, G. A teoria da democracia revisitada. Ática, São Paulo: Ática, 1994.
SCHAFF, A. A sociedade informática. São Paulo: Brasiliense, 1995.
TOFFLER, A.Powershift. Rio de Janeiro: Record, 1990.
VAZ, P.; LISSOVSKY, M.; PECLT, G.; FANTINATO, M.; POMBO, M. Mídia, formação da opinião pública e voto popular: As narrativas de crime na TV e o referendo sobre o comércio de armas. Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação. UFRJ. Abril de 2007 - 2/22. Disponível em: <www.compos.com.br/e-compos>. Acesso em 10 jan. 2008.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Compartilhamento de mídia social, notícias e formador de opinião: pesquisas recentes

NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DE PESQUISAS QUANTI E QUALI

DIFERENÇAS ENTRE PESQUISAS QUALI E QUANTI

COMO REALIZAR UMA PESQUISA DE OPINIÃO